quinta-feira, 6 de agosto de 2015

Cinza

 Deve haver, em algum ponto desconhecido, um sentido em tudo isso. Quando tudo é muito simples, eu me assusto, me enfraqueço. Mas, quando tudo é tão incerto, eu questiono a vida, o destino, ou sei lá o que. Mas não, não é possível que seja exatamente assim, sem qualquer ponto de equilíbrio. É um esforço muito grande, que nunca acaba, me provoca ao olhar pra trás e ver soluções e, a frente, incertezas, medo, insegurança em aspectos incontroláveis. A palavra que me vem à mente é “impostor”. Mas é mais do que isso, é um sentimento indefinido. Não se trata de um medo irracional, descontrolado. É como olhar para algo vago, distante, paradoxalmente ao meu lado, sem que eu saiba como lidar com isso. É um velho sentimento de impotência, uma fuga continua e exaustiva. Mas que opção eu tenho a não ser prosseguir? Nenhuma. Ao menos não enxergo.

Lembro-me de caminhar confiante, olhando a torre tão próxima, parecia ao alcance das mãos. E a cada novo quarteirão, mais um haveria. Um percurso denso, uma espera tensa. Penso no acaso, talvez seja mais fácil entender dessa forma. Penso no que os outros pensam sobre o mesmo olhar. O caminho me parece o mesmo, sempre, mas as ruas são cada vez mais largas, e menos espaço. Pouco entendimento. (Sinto falta da perspicácia de um escritor no ato descritivo dos locais e os seus detalhes mais futeis, parecendo tão úteis).

Nessa hora, escorrego os dedos sobre os livros na estante. Há quanto tempo estão lá. Empoeirados. Pressiono com mais força um deles, como se o fosse escolher, mas me contenho por algo que não sei o que é. Reflito um momento sobre a leitura. A falta dela. Recordo os livros importantes, e me lembro dos que não li. O tempo passou e nada aconteceu. Não estou chateado por isso. Eu tenho coisas importantes, mas me atrapalha a importância que as coisas menores ganham em meu dia a dia. Penso na rotina de lavar a louça do almoço, demoradamente, enquanto observo orgulhoso as plantas do meu jardim. Tudo acontece desde que eu produza. É uma lógica fácil de ser entendida. E depois, degusto a incrível sensação de observar em silêncio, como se pensasse em algo realmente relevante. Penso em mim. E me parece prudente.

Gosto tanto do inverno. Tudo parece tão favorável. É um distanciamento reconfortante. Não gosto dos nomes que me vem a mente, às vezes, sem querer, porque quebram a concentração no que mais aprecio. A fumaça que sai da xícara de café, enquanto quente. É a visão que fixo para esquecer. Busco distrações e me orgulho disso, não me envergonho. Sinto-me confortável e não me intimido. Programo cada segundo de paz, de uma vida inteira, caso esse êxtase utópico um dia aconteça, ao menos materialmente. Pareço criança, eu sei. De fato não me importo com essa aparência. Aliás, de repente, isso deixou de ser relevante há algum tempo. Incomoda-me um pouco essa alternância entre o banal e o essencial, na mesma referência. Mas não luto contra isso com tanta força. Tento esquecer. Mas, claro, não consigo.

E esses tantos minutos que me trazem de volta à mesa, à folha em branca, ao lápis de mentira. Dobro os joelhos, às vezes, ainda. É onde tudo pode acontecer (positivamente pensando). As ideias são tão escassas. Espaçadas. perdidas. E, de verdade, me importo pouco nesse momento. Não vou misturar emoções diferentes. Agora não, convenientemente. O sol já está de volta. Mas é bem possível que o mundo não acabe e que continuemos a tentar entendê-lo. Mas eu ainda me rendo aos poucos e bons momentos em que penso em nada, frente ao café e sua fumaça com cor de inverno. 

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