segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Lobisomem

Que importa isso agora? Se antes eu caminhava sobre uma ponte estreita, agora, percebi que não posso mais voltar. Recomeçar não é uma opção, nesse caso. Quando se resolve partir, sempre fica, mesmo quando não se admite, uma pontinha de pensamento sobre alternativas para retornar, se tudo não sair bem. Mas estou sozinho, irreversivelmente. Não há mais o mundo que deixei.

É apavorante. Andar nessa trilha, há tanto tempo marcando o caminho, deixando pistas, e ver tudo desaparecer assim sem avisar. Eu voltei meus olhos para trás e só enxerguei escuridão. E agora, a ponte, ainda mais estreita, quase me desequilibrou.

Por um breve momento, eu não sei mais quem sou. Não compreendo do que é composta minha percepção, minha pobre cultura, minha alma. E agora, não sei mais em que acreditar. Estou, literalmente, suspenso. Não houve mudanças. Houve transformações, sem que eu visse.

Desconheço meu universo teórico. Minhas referências nunca estiveram tão distantes. Fecharam a porta ao sair sem que eu as ouvisse. E estou sozinho, sentado no chão, com esses livros todos a minha volta. Perdi a capacidade de ler. Não estou cego. Estive há tempos, mas não sabia. E, agora, todas as letras me são estranhas.

Quem somos nós afinal? Dê-me sua mão para que eu não tropece. Não. Ninguém responderá meu chamado. Não se trata de indiferença. Simplesmente, todos se foram. Deixaram em meus braços o que me juravam ser importante, até que eu acreditasse, contra todas as falsas evidências. Contraditório, eu sei. O que vou fazer com todo esse peso agora?

Pensava que a vida traçava caminhos tortos. Para que tudo se endireitasse adiante. Mas descobri, agorinha mesmo, que não há outra opção além dessa. Acabou a falsa tranquilidade que chamamos de possibilidade. Estou em um exame final, com uma única alternativa. Arriscar não está mais em pauta. Resta-me acertar, mesmo que tudo saia errado, é meu único destino.

Não grito por socorro. Ninguém vai mesmo me ouvir. Esse é o significado da palavra sozinho. E, agora, significar me dá medo. Palavra, em sua essência teórica, é assustadora. Tudo o que refere me amedronta, porque somente meus olhos enxergam, hoje, aquilo que outrora me apontavam com tanta clareza.

Sequestraram minha identidade. Fui conivente, pensando em resgatá-la no momento certo e devolvê-la aos meus guias. Hoje, soube que eles se foram e, agora, me obrigam a crescer sozinho, por caminhos jamais ensinados.

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