sexta-feira, 3 de julho de 2009

Chegada a hora

Ele olha pela janela do apartamento enquanto ela, no canto da sala, logo às suas costas, chora baixinho. Ele vê um, dois carros passando, ela se lembra da árvore sobre a qual se beijaram pela primeira vez. Ele se volta para dentro, fita rapidamente o olhar no olhar dela, e continua seu silêncio. Ela lembra do dia em que o chamou para subir pela primeira vez, ele procura entre as coisas as suas próprias coisas. Ela chora como chorou pela segunda vez quando o quis por perto, ele põe outro objeto sem importância dentro da sacola plástica. Ele, voltando do quarto de dormir, está assegurado de que lá não ficou nada seu, ela já procura um jeito de retirar do quarto tudo que a faz se lembrar dele. Ele passa pelo corredor, vira a porta da sala de estar na qual ela ainda chora. Ela, desajustada, não se preocupa em dizer nada, tudo já está entendido por ele. Ele já sabia deste momento, ela também. Ela, a cada dia, era um dia mais próximo dessa ocasião, ele, a cada dia, estava um dia menos angustiado de outras ocasiões. Ela o esperava toda semana, ele esperava toda semana passar. Ele, comprometido, a conheceu na faculdade, ela, solteira, o conheceu em um dia de primavera.

Ele põe a sacola dentro de uma bolsa, ela fita a bolsa para nunca mais esquecê-la. Ela sabia que um dia ele chegaria, e pela primeira vez não haveria beijo, presentes, sexo, e água gelada depois. Ele sabia que nesse dia ela choraria. Ela faz um balanço do que ele significou em sua vida, ele balança a bolsa até a segurar com os ombros, encostando em suas costas. Ela se lembra dos seus telefonemas e dos dias em que trazia alguma surpresa, ele está surpreso, pois, tudo estava como deveria estar. Ele também chora, mas não quer que ela veja. Ela chora desesperadamente, na esperança com que seja percebida por ele. Ele termina o copo d água enquanto ela pensa em se desfazer do copo. Ela já o vê abrindo a porta e indo embora para sempre. Ele ainda segura um passo, faz que vai e se vira para ela. Suavemente, ela gira a cabeça em sentido contrário ao olhar dele. É uma reprova. Ele se machuca com a atitude dela. Ele parece cicatrizar com essa negação. Ele se volta, baixa a cabeça e passa pela porta, que é batida com leve força por ela. Ela então encosta na porta e solta o peso do corpo, ele, do lado de fora, a escuta escorregando até o chão. Ali ela chora até sentir sede e adormecer, enquanto ele entra em seu carro e volta para a casa.

com os merecidos créditos para o autor Varela

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