segunda-feira, 1 de agosto de 2016

Agonia de um escritor

Tremia sem muito controle sobre a calma, com as mãos cegas a procura da caixa de remédios, sempre preventivamente no mesmo local. Engoliu um e, ainda com as mãos trêmulas, o segundo, sem água, a seco, rapidamente, a procura de um alívio além da alma ferida. Não sabia ao certo qual reação a cada palavra mal entendida deveria ter. Pensou em silenciar. Não foi capaz. E rapidamente teceu algumas palavras à luz do que sentia instintivamente. O silêncio de réplica.

Pensou, quase que imediatamente: “foi escrito à lápis, propositalmente, para que fosse apagado quando conveniente”. O alívio não vinha. A calma não iria reinar mais, em nenhuma hipótese que não fosse o voltar no tempo e desfazer o que era feito, desdizer o que disse. Por que tinha ele que ser tão real, tão passional, se teria sido mais fácil ser superficial?

Via minuto a minuto a distância aumentar e o corroer por dentro. Dizer qualquer desculpa dessas já não cabia, não explicava, não resolvia e não aceitava. Não sabia, ainda, se assim seria, de fato, irremediavelmente. Mas sabia, com toda certeza, que não queria nenhum rascunho inacabado. Sim, rasgaria todas as páginas da obra não escrita, por mágoa, uma raiva incompreensível. Quantas noites de sono, quanto de alma fora consumido para essa escrita!

Lembrava de Pessoa, ele mesmo, o Fernando, e tinha raiva da citação guardada desde o sexto ano da escola. Não, nem tudo vale a pena, não importa o tamanho da alma, nem a grandeza do momento.

Não há perdão, nem desculpa, nem nenhuma situação que se sustente assim. Mas tentava a calma, em benefício próprio. Achava que teria uma história. Olhou e contemplou o vazio do coração. Jurou mantê-lo frio, gelado, rígido. Para sempre, nada de bom seria permanente.


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