segunda-feira, 17 de agosto de 2009

Quando as bocas se calam

Dois ou três terços de hora de pura hostilidade recíproca. Nada que os ponteiros do relógio não possam consertar com seu simples movimento lento. O silêncio perdura. Até mesmo o pensamento se cala. Poucas palavras ameaçam ser imaginadas, até que algum solavanco no banco do táxi trouxesse a realidade à tona.

Ao chegar, vê-se a janela semi-aberta. Cortinas ao vento. Uma casa convencional que escondera histórias por séculos. Mais de vinte almas enterradas e esquecidas no interior daquelas paredes. Tudo tão perdido que não pode perceber. Mas ainda há uma atmosfera alheia aos últimos anos.

Não poderia ser tão ruim olhar-se no espelho, mesmo não se reconhecendo. Esse processo leva cerca de quatro horas. Um desligamento total do universo, para concentrar-se unicamente na própria imagem, perceber as imperfeições, para não mais esquecê-las. Cada poro do rosto carrega um estigma.

Resolvem se falar. Apenas o essencial. Um café frio chega à mesa. Um gesto de reprova, mas nenhum comentário adjacente. As luzes ainda apagadas deixam a sala ligeiramente escura e sol já vai se pondo.

Na noite consiste a certeza do sono. Deitam-se nos lençóis claros, pesados, assustadores como fantasmas em lua cheia. Os olhos permanecem abertos para nunca mais fecharem. Caberia uma música, mas todos agora estão condenados ao silêncio. Definitivamente.

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