domingo, 28 de maio de 2017

O convívio

Acordou sem propósito algum, como em todos os dias. E como em todas as manhãs, partiu para o mesmo ritual mesquinho de higiene e lazer, como se o mundo fosse só aquilo que seus olhos viam e que sua mente seriamente limitada permitia enxergar, com os olhos da alma definhada em estranhezas indescritíveis e formas de pensamento desprezível mesquinho.

Ainda pela manhã, sabia exatamente o que faria o dia todo, aquele cotidiano fútil que seu cérebro insistia em acreditar ser grande e completo, justificável, por tudo aquilo que seu pequeno universo conhecia. Mas isso não é o bastante para a personalidade controladora e falsamente manipuladora, pela insegurança e pela necessidade de se confirmar.

Mas, ainda assim, não era mau. Tinha, no fundo, um bom coração. E então buscava suas ações condizentes com isso, desde que coincidentes com seus ideais. E todos se esforçavam para que o foco fosse exatamente no que havia de bom, de útil, de prazeroso e valioso naquele ser peculiar.

Quando tudo parou de funcionar, num dia de semana qualquer, como se nunca pudesse contar o tempo, ficou irritadamente surpreso. Procurou pela casa vazia e não entendia o porque não havia ninguém. Apenas um bilhete, com as últimas palavras, de alguma mensagem falando algo sobre cansaço, impaciência, intolerância e adeus.

Tentou o celular, pois as máquinas não pensam; simplesmente obedecem. Funcionou, segundo a sua vontade, porém, nenhum número atendia, nenhuma voz do outro lado, nenhum contato. Nada. Já na rua, nenhum rosto amigável, nenhum tipo de saudação. Todas as pessoas desapareciam magicamente, assim que seu olhar as cruzava. Nada novamente.

A TV ligava, saia um som distante, como se todos dissessem ofensas aos seus ouvidos. Nada o satisfazia, nenhum contato humano, já há 11 dias. No mesmo espaço, com as mesmas roupas, a mesma rotina. No 12o dia o silêncio era demais e até os pensamentos não falavam com ele. Estava enlouquecendo e provando o veneno que não acreditava existir. Era irreal. Pensou se não estaria sonhando, esperando que acabasse logo. No dia número 13 percebeu que não era um sonho, porque nem sonhos o permitiam visitar durante a noite.

Quando o dia 14 amanheceu, a tortura era insuportável. E, de repente, tudo voltou ao normal, como se nada tivesse acontecido. E tudo em que ele pensava era em tudo o que aconteceu.


Não era o fim.

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